quarta-feira, 27 de abril de 2011

O debate sobre o Código Florestal*

Mentem aqueles que dizem que o atual Código Florestal Brasileiro não conserva a natureza e por isso é necessário alterá-lo. Ele não conserva quando não é respeitado, como acontece em muitas situações. O Código Florestal Brasileiro é bom. É bom porque assegura, minimamente, o equilíbrio ecológico, tão necesserário à manutenção de todas as formas de vida, inclusive das culturas agrícolas e dos rebanhos. É bom porque garante, minimamente, a conservação da água, do solo, das formas naturais de vegetação, da riqueza de espécies da fauna e da qualidade do ar. Sem isso não há como vicejar e manter a vida sob todas as suas formas.
Mentem aqueles que afirmam que é preciso produzir mais alimentos para que o povo não passe fome. Há alimentos de sobra nas prateleiras dos armazéns e dos supermercados, nas bancadas das feiras e mercadões, nas lanchonetes, nos restaurantes, nos postos de gasolina e até nas farmácias tem o que comer. Os que passam fome é porque não possuem dinheiro para comprar o alimento. Metade da produção de grãos do Brasil é utilizada para fabricação de ração animal para alimentar rebanhos confinados de gado na Europa e na Ásia. O Código Florestal Brasileiro é bom. É bom porque mantém o Brasil em posição de vantagem em relação a outros países no tocante à existência de fontes e bens naturais, matérias primas cada vez mais escassas no mundo, infelizmente. É bom porque pede de cada proprietário rural, a sua cota de contribuição em um momento cujo sentimento de coletividade é de suma importância. O Planeta é um só. Nossa grande “casa” passa por um momento crucial, pois nossa consciência e ação, enquanto espécie biotecnológica, ainda são insuficientes para reverter o desequilíbrio já provocado.
Mentem aqueles que comentam que o atual Código inviabiliza culturas de arroz, café, maçã ou banana em áreas de preservação permanante – encostas e margens de rios. Tais culturas continuam sendo mantidas pelos seus produtores. Uma adequação do Código para estas situações é algo pertinente. Basta mapear essas áreas e prever na forma de lei a possibilidade destas culturas agrícolas, com adoção de práticas que conservem o solo e a água.
Mentem aqueles que comunicam que é necessário que a revisão do Código seja votada já, tendo em vista a expiração de prazo - em 11 de junho próximo - de anistia a proprietários que estiverem em desacordo com a lei. O Governo, até então omisso na discussão, já admitiu a possibilidade de prorrogação do decreto que determina o início das autuações. Desta maneira, poderemos ter tempo para avançar numa proposta de lei mais sensata, que privilegie a discussão baseada em fatos reais, em ciência confiante e na participação ampla da sociedade. 
Iludem aqueles que buscam um consenso neste momento. Trata-se de um falso consenso: “aumenta isso, diminui aquilo”. Ridículo. O que tomam por base para decidir que 15 metros de cada margem de um córrego é suficiente para preservá-lo? É evidente que se lograr êxito esta proposta de “consenso” do Governo, os bens naturais sairão profundamente prejudicados. E não é só de carne, leite, pão, arroz, álcool e feijão que vive o ser humano. Nós bebemos água, construímos as cidades sobre o solo e o subsolo, nos abrigamos da luz do sol sob a copa das árvores, ouvimos os pássaros, pescamos, somos sabedores da existência dos bichos, nos banhamos no mar e nos rios, vemos um céu azul, cultivamos o solo, sentimos os benefícios de chuvas não ácidas, nos inspiramos diante de uma bela paisagem natural, e principalmente, respiramos ar puro. Então, só de negócios agropecuários viverá o Brasil? Nosso país tem motivo suficiente para aderir à uma economia verde e ser muito mais do que uma moderna fazendona.
A “necessidade” de revisar o Código Florestal Brasileiro surge a partir do agronegócio que rompe profundamente com os ciclos e ritmos da natureza, que ignora a distribuição da riqueza gerada a partir da comercialização dos produtos advindos da terra, que se alastra pelo meio político sustentado apenas pela lógica do mercado, e que agora dita leis e políticas “públicas” governamentais.
O que está destruindo a natureza é a ignorância e a ganância.

*Perci Guzzo é ecólogo